quarta-feira, 25 de junho de 2025

Existe “normal” para quem tem transtorno bipolar? - Reflexões

Por vezes, quando estava em crise, me perguntava se aquela era quem eu era de verdade ou se existia algo além de toda a confusão mental. Perguntava-me se havia um “normal”, um estado em que a mania e a depressão não eram constantes. Certamente eu não sou a primeira e nem a última que já se perguntou isso.


Mas o que é ser “normal”? É ter um padrão linear, equilíbrio emocional e constância? Isso é mesmo possível para um bipolar? Perguntas que para alguns a resposta pode ser desanimadora.


Então como ser você mesmo e não se perder no descontrole? Para mim foi aceitar que o caos e o vazio fazem parte de mim, e que eu tenho que aprender a lidar com eles, descobrindo coisas que ligam um ao outro.


Por exemplo, eu escrevia bastante quando era mais nova, mas conforme fui crescendo esse hábito foi sumindo. A vontade de voltar a escrever era grande, mas faltava-me coragem para voltar, até que esse ano decidi criar o blog. Estou longe de ser uma boa escritora, mas é algo que me dá prazer.


Relembrar como era antes da bipolaridade vir à tona é difícil, mas é um exercício a ser feito em busca do autoconhecimento.


O que você sente falta de fazer, que gostaria de retomar? Ou há algo que você gostaria de começar? A depressão muitas vezes nos tira o chão e nos deixa no limbo, e quanto mais tempo passamos nela, mais fica difícil de sair. Por isso, relembrar é importante: porque faz lembrar o que nos conecta à realidade.


Não existe uma identidade falsa. Todas as nossas fases fazem parte de quem somos, até mesmo aquelas que gostaríamos de esquecer. A estabilidade pode ajudar a ver isso com mais clareza, mas aceitar essa complexidade também é um caminho de liberdade.


Em vez de buscar ser “normal”, talvez o caminho seja buscar ser autêntico. E ser autêntico, para quem vive com bipolaridade, pode significar:

  • Conhecer seus gatilhos e suas forças;

  • Respeitar seus limites, mesmo quando o mundo espera mais;

  • Ter coragem de dizer “não estou bem hoje”, sem culpa;

  • Reconhecer que sua sensibilidade, intensidade e criatividade também são dons.

Não é romantizar o transtorno, mas entender que faz parte de nós. Não existe um “normal” fixo para nós, e sim um caminho de autoconhecimento, aceitação e construção de uma identidade verdadeira.


Música de hoje: Keane - Everybody's Changing

quarta-feira, 18 de junho de 2025

A Arte como Refúgio: Como Escrever, Desenhar e Cantar Ajudam a Lidar com os Extremos Emocionais da Bipolaridade



Viver com transtorno bipolar é viver altos e baixos. De um lado a euforia, do outro, uma tristeza profunda, beirando o vazio. Muitas pessoas encontram na arte um meio de expressar as emoções contidas durante esses dois pólos.

O transtorno bipolar mexe com o nível de energia, com a intensidade emocional e com a forma de perceber o mundo. E a arte, por natureza, é expressão. Quando estamos no alto da euforia ou no fundo do poço, o que falta são palavras, espaço ou até permissão para extravasar o que sentimos.

A arte não julga, não exige explicações, nem correções. Ela acolhe. Permite que a dor seja cor, que a raiva vire som, que o vazio seja escrito. A arte pode: Reduzir o estresse; Ajudar a expressar emoções reprimidas; Melhorar o humor; Aumentar a autoestima; Reforçar o senso de identidade.

Neste artigo, quero compartilhar como escrever, desenhar, cantar, pode ser um meio de ajuda para lidar com os extremos emocionais da pessoa bipolar.


Escrever: Transformar o caos em palavras

Escrever, para quem tem bipolaridade, pode ser como organizar a bagunça interna. Quando as ideias estão rápidas demais (como na hipomania ou mania), escrever ajuda a desacelerar. Quando a depressão cala tudo, escrever pode ser uma forma de não se perder de si mesmo.

Você pode tentar:

  • Escrever diários/cadernos emocionais: não precisa ser em um diário, desses que as meninas usam. Pode ser um caderno qualquer, o importante é registrar os sentimentos sem filtro;

  • Poemas ou cartas: mesmo que nunca sejam lidos por ninguém;

  • Blog pessoal ou rede social: compartilhar sua vivência pode ajudar você e outros.

O ato de escrever permite que você visite e revisite quantas vezes quiser e comparar o que estava sentindo em cada momento da sua vida. Também pode ajudar a identificar padrões quando você está entrando em mania ou depressão.

Desenhar ou pintar: quando o corpo sente o que a mente não entende


Nem sempre temos palavras para o que sentimos e está tudo bem. A pintura ou desenho entra aqui como um meio entre o sentimento e o mundo exterior. Quando há muitos estímulos ou estamos completamente entorpecidos, pegar um lápis, caneta ou pincel pode ajudar a colocar para fora o que não conseguimos explicar.


Não é sobre ser “bom” em desenhar, é sobre usar o gesto como desabafo, um meio de se expressar:


  • Pintar cores fortes quando tudo explode por dentro;


  • Rabiscos nervosos para a raiva que não pode sair em palavras;


  • Formas suaves quando a ansiedade precisa ser acalmada.


Esse tipo de arte pode ser feito em casa, no caderno, em uma tela digital, o que importa é a sensação de alívio e liberação.


Cantar e criar músicas: dar voz ao que pulsa


A música tem uma conexão profunda com o transtorno bipolar. Não à toa, muitos artistas com esse diagnóstico expressam suas dores e delírios por meio de sons. Cantar pode ser uma forma de libertação emocional imediata.


Você pode:


  • Criar playlists para cada fase (mania, estabilidade, depressão);


  • Gravar áudios cantando ou falando sobre o que sente;


  • Compor (mesmo sem instrumento);


  • Cantar no chuveiro, na sala, no carro, onde for seguro.


O som da sua própria voz pode ser uma forma de se lembrar de que você ainda está aqui, mesmo quando tudo conturbado ou vazio.


A arte não cura o transtorno, mas pode curar partes da alma


Importante lembrar: arte não substitui medicamento, terapia ou acompanhamento profissional. Mas ela pode acompanhar o tratamento e tornar o processo muito mais leve. Pode ser o espaço em que você se reconhece, quando tudo o mais parece estranho.


Ter transtorno bipolar é conviver com extremos. A arte não anula esses extremos, mas ajuda a atravessá-los com mais gentileza. Mesmo nos dias em que tudo parece perdido, um rabisco, uma frase ou uma canção podem lembrar: você ainda está aqui.


quarta-feira, 11 de junho de 2025

Descontrole Financeiro na Fase Maníaca do Transtorno Bipolar: Entenda e Saiba Como Lidar



Lidar com o transtorno bipolar no dia a dia já é uma tarefa complicada e que requer atenção, e uma área importante é a área financeira. Isso porque durante a mania, tendemos a comprar mais de maneira compulsiva, podendo afetar até mesmo os entes queridos.

Pessoas que ainda não foram diagnosticadas com o transtorno podem passar anos entre o endividamento e a estabilidade. Muitas vezes sendo vistas como irresponsáveis ou sem controle, quando na verdade estão precisando de ajuda com uma condição clínica.


Mas por que a mania afeta o financeiro?

A fase maníaca ou de mania é uma das fases do transtorno bipolar. Nela, a pessoa costuma apresentar: Aumento de energia e euforia, ideias grandiosas (megalomania), diminuição da necessidade de sono, aumento da impulsividade e tomada de decisões arriscadas.

Durante a mania, o cérebro do bipolar está hiperestimulado. A dopamina, um dos neurotransmissores ligados à sensação de prazer e recompensa, costuma estar em níveis elevados, o que provoca um forte desejo de prazer imediato.

Esse comportamento impulsivo, muitas vezes aliado a uma autoconfiança excessiva, nos leva a decisões financeiras perigosas, fazendo com que a pessoa:

  • Compre por impulso, mesmo sem necessidade;

  • Faça empréstimos ou use cartões de crédito sem pensar nas consequências;

  • Invista em negócios arriscados, acreditando que "vai dar certo";

  • Ignore alertas e conselhos de familiares ou amigos;

  • Negue os problemas financeiros que está causando.


Como reconhecer os sinais de alerta?

É importante que saibamos identificar os sinais de que o comportamento financeiro está saindo do controle, para que assim possamos agir rápido. Preste atenção a:

  • Gastos repentinos e exagerados;

  • Compra de itens caros e/ou desnecessários (ex: eletrônicos, roupas de luxo, viagens);

  • Doações ou empréstimos impulsivos de dinheiro;

  • Criação de empresas ou projetos “milagrosos” da noite para o dia;

  • Irritação quando confrontado sobre as finanças.


Estratégias para o controle financeiro

É importante ter estratégias para quando estiver na fase maníaca, assim pode-se mitigar os possíveis danos.

  • Limite o acesso a crédito
    Reduza ou cancele cartões, estabeleça limites de saque e evite deixar dinheiro fácil de ser gasto.

  • Pague em dinheiro
    Dê preferência a pagar em cédula, assim limita-se o acesso ao dinheiro.

  • Tenha um responsável financeiro
    Em fases de estabilidade, avalie deixar contas e investimentos sob supervisão de alguém de confiança.

  • Crie alertas de gastos
    Aplicativos bancários podem ajudar a monitorar compras e emitir avisos em tempo real.

  • Evite decisões importantes durante a mania
    Assinar contratos, fazer grandes investimentos ou compras deve ser evitado nesse período.

  • Tenha um plano de crise
    Um documento com orientações para momentos de descontrole, elaborado com seu terapeuta ou psiquiatra.

  • Fique longe de lugares que te tentem
    Evite lojas físicas e online. Não deixe os dados do cartão salvo, mais uma etapa pode fazê-lo desistir da compra.

  • Priorize pagar as dívidas já feitas
    Tente manter o mínimo de dívidas e busque quitar as já existentes. Comece da menor para a maior.


Por fim, não se martirize quando fizer uma compra que não devia. Somos humanos e falhamos e falharemos no futuro, o importante é tentar e não desistir. Com consciência, tratamento e planejamento, é possível retomar o controle da sua vida financeira e emocional.


quarta-feira, 4 de junho de 2025

Como contar para amigos, família ou colegas sobre o diagnóstico



Receber a notícia que você é bipolar é um misto de alívio, medo, insegurança e vergonha. Alívio porque você finalmente tem um nome para o que vinha sentindo, medo, insegurança e vergonha por não saber como as pessoas vão reagir.

Então surgem as dúvidas: “Devo contar? Para quem? Como?”

Não existe uma resposta única, certeira, mas pode ser o primeiro passo para fortalecer vínculos e aliviar o peso do diagnóstico.


É sua escolha, é só sua


Contar ou não contar é uma decisão apenas sua. Não precisa sair contando para todo mundo. Avalie quem é de sua confiança e que vai entender a situação. O diagnóstico faz parte de você, mas não define quem você é.


Falando com a família: acolher e educar


Algumas pessoas não são bem informadas no assunto. Não é falta de amor, muitas vezes é medo ou desconhecimento.


É válido explicar o que é a bipolaridade. Esteja preparado(a) para perguntas, dúvidas e até reações confusas. Para isso também é importante você se informar mais sobre o transtorno. Você pode indicar leituras, vídeos ou até sugerir que te acompanhem em uma consulta, se se sentir confortável.


Amigos: a escolha do acolhimento


Escolha aquele(s) amigo(s) com quem você tem um grau maior de afinidade, aquele que você sabe que te acolhe e não vai fazer julgamentos. Você não precisa se justificar ou falar além do que se sente confortável. Amigos de verdade vão entender e caminhar ao seu lado.


Colegas de trabalho: precisa contar?


A resposta é não, apenas se for necessário.

Colegas de trabalho não são seus amigos, nem sua família. Eles são importantes apenas no campo profissional e você não deve satisfação a eles.


Agora, se você percebe que o seu humor está afetando seu trabalho, você pode conversar com seu gestor ou com o RH. Atenção: Alguns ambientes de trabalho são hostis. Você não é obrigado a contar nada se assim o desejar. A escolha é sempre sua.


Dicas para a hora de contar


  • Escolha um momento tranquilo, sem pressa.

  • Fale de forma simples, não técnica, se perceber que a pessoa não entende muito sobre saúde mental.

  • Foque em como você está se cuidando. Isso ajuda a pessoa a entender que existe tratamento e estabilidade.

  • Esteja preparado(a) para diferentes reações: algumas pessoas não vão saber o que dizer, outras podem surpreender com acolhimento.

  • Se sentir que não foi ouvido(a) ou acolhido(a), não se culpe. O problema não é você, é a falta de preparo do outro.


Contar alivia o peso do segredo. Ter alguém com quem contar é importante para não nos sentirmos solitários. Você merece ser cercado de acolhimento, de pessoas que o entenda.